20 de abril de 2016
Querido diário,
Eu finalmente achei que
as coisas estivessem se ajustando. Quer dizer, não que tudo esteja bom, mas eu
já estou me acostumando a algumas coisas. Mentir para Jessica não parece tão
doloroso. É uma parte de mim. Transar com Natan já é algo bastante automático.
Lidar com os olhares de todos na escola também é algo com o qual já me
acostumei. Algo que acho importante que fique registrado é: as pessoas sempre
dizem que “em breve, todos esquecerão.” Bem, isso é uma grande mentira.
Gostaria de me lembrar disso para sempre.
Olhares de estranhos já
me incomodaram mais. Eu costumava ir direto para o banheiro quando chegava na
escola. Sentia vontade de chorar sempre que uma pessoa me dirigia uma expressão
maliciosa. Às vezes, ouvir um comentário na fila da cantina me tirava o
apetite. Agora já aprendi a lidar com algumas dessas reações. Não é algo que eu
goste, ou que eu ache bonitinho de ouvir é só que... as pessoas não são tão criativas
quanto pensam. Já ouvi tantos trocadilhos e comentários que nada mais me
surpreende. Poucas coisas me chateiam agora. Minha expressão tem se mantido
constante.
Contudo, hoje foi um
dia atípico. Ok, todos os dias tem sido atípicos desde a publicação do vídeo,
mas essa é a minha vida, tenho que aceitar o que ela é. A questão é que Rodrigo
veio falar comigo hoje. Eu não tenho certeza se estava pronta para encontrar
com ele. Já o tinha visto algumas vezes pelo colégio, mas achei que tínhamos um
acordo silencioso de não falar um com o outro. Quando ele chegou perto de mim,
senti um calafrio estranho. Senti como se ele fosse pedir para ir para a cama
com ele, como Natan faz todos os dias.
“Por que você fez
isso?” Ele me perguntou. Então ele fazia parte do grupo de pessoas que acha que
fui eu quem vazou o próprio vídeo. “Por que VOCÊ fez isso?” Eu respondi. “Foi
você quem gravou o vídeo. Eu só participei da ação e ainda assim, sem saber.”
Aprendi a lidar com a culpa, aprendi a aceitar olhares das pessoas. Mas essa
culpa não era minha.
“Eu queria só uma
memória para a gente. Você consegue entender? Eu queria que você olhasse e
pudesse rever esse momento várias vezes.” Ele me disse. Pois é, que romântico.
“Pode ter certeza de
que eu já vi mais vezes do que queria. O maior problema, Rodrigo, foi que você
nunca me mandou o vídeo. Quando eu pude ‘lembrar da nossa noite’ já estava na
minha linha do tempo, com mais de duzentas curtidas e treze compartilhamentos.
Isso porque nem te digo quantas pessoas marcaram ‘amei’.” É estranho como
conversas importantes deixam as palavras na nossa mente. Escolhi escrever as
exatas palavras que cada um disse para eu poder reler depois.
“Você acha que fui eu
quem postou o nosso vídeo?” Ele me disse. Claro que eu achava que era ele. Quem
mais teve acesso ao vídeo. “Desculpa, Vivian, eu posso ter filmado, posso até
ter mostrado para algum amigo, mas não fui eu quem colocou o vídeo no
Facebook.”
“E como foi que você
‘mostrou para seus amigos’?” Eu perguntei. A resposta era lógica. As pessoas
não se reúnem mais. Se ele mostrou para alguém, foi pelo Whastapp. Ele tinha
viralizado meu vídeo sem nem se dar conta. Mas agora não tinha importância. Nos
celulares, o vídeo já se espalharia, mas na internet, o estrago seria ainda
maior. Quem colocou meu vídeo no Face queria que eu fosse exposta, queria
colocar minha cabeça a prêmio.
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